-
Início
- Free Running Especial Páscoa
Free Running Especial Páscoa

Oferta de Pitas e Sardões
A Páscoa é a principal celebração da liturgia cristã, assinalando a ressurreição de Cristo ocorrida três dias após a sua crucifixão.
As comunidades revivem a época pascal através de manifestações preponderantemente religiosas, nuns casos perfeitamente enquadrados e sancionados pelas entidades eclesiásticas, outras vezes imbuídas de uma religiosidade popular muito própria e distinta de cada população, num plano de motivação votiva que diverge da ortodoxia.
Numa outra perspetiva surgem ainda as manifestações de evidente pendor profano, que parecem provir de uma visão animista do mundo, de uma umbilical relação entre o homem e os ciclos da vida e da natureza, como a sucessão das estações do ano e a renovação da vida depois da longa "morte" do inverno. Esta espiritualidade relacionada com o "renascimento" da vida na primavera introduziu a crença universal da ressurreição divina, que se afirmou em quase todas as religiões antigas, como é o caso do culto egípcio de Osíris, ou o culto sírio de Adónis, e que, mais tarde, virá a encontrar representação também na Páscoa cristã.
A tradição das "pitas" e dos "sardões" de Lousada parece estar associada a esta ideia de renovação da vida animal e vegetal que se manifesta na primavera. Simultaneamente afigura-se como uma manifestação da essência espiritual dos animais em questão, que projetam todo um conjunto de conceitos ligados ao ciclo da vida: fecundidade, fertilidade, maternidade.
A "pita", no que concerne à tradição de Lousada, consiste num pão de massa de trigo, com cerca de um quilo guarnecido com um ovo, que fica alojado sob a cauda. Para dar um aspeto mais realista, próprio de uma galinha, a massa era cortada com o bico de uma tesoura para simular penas, moldando-se igualmente um bico e introduzindo-se, por vezes, dois grãos de milho a fazer de olhos.
O "sardão" também é feito à base de massa de trigo e moldado para que se distingam claramente as diferentes partes do corpo, com a valorização da cabeça e da cauda ligeiramente enrolada.
Suaves incisões no dorso procuram imitar as escamas e os olhos, enquanto uma tira de cetim vermelho inserida na boca aberta finge uma língua, acrescentando-lhe uma índole picaresca.
Na opinião da investigadora Rosa Maria dos Santos Mota, esta tradição ter-se-á desenvolvido ou até originado na freguesia de Figueiras, tendo-se mantido circunscrita a uma área compreendida entre Lousada, Freamunde e Paços de Ferreira.
Apesar de existirem tradições em certos aspetos comparáveis, designadamente no que respeita à confeção de pães zoomórficos, a mesma autora, no seu artigo "Tradições da Páscoa em Lousada: as pitas e os sardões", conclui no sentido de considerar o costume de Lousada original.
Com efeito, em Guimarães, por exemplo, os mesmos animais confecionados com ingredientes diferentes, são utilizados num ritual de cortejamento em que os rapazes ofereciam um “sardão” à sua eleita e a rapariga, se quisesse corresponder, oferecia uma “passarinha”.
Ora, em Lousada esta dissimulada carga sexual não está presente desde logo pelo facto dos pães zoomórficos serem oferecidos às crianças pelos seus padrinhos, pais ou avós, recebendo os rapazes o “sardão” e as raparigas a “pita”. E embora os termos usados para identificar os pães pertençam à gíria popular e remetam, de forma figurada, para o sexo masculino e feminino, não se vislumbra, pelo menos no momento atual da investigação de Rosa Maria dos Santos Mota, na tradição lousadense qualquer relação com rituais de corte ou de passagem.
A originalidade desta tradição e a atual raridade do uso de pães zoomórficos motiva-nos a conhecer melhor este costume, a procurar-lhe as raízes, mas, acima de tudo, a resgatá-lo do esquecimento a que parecia destinado. Recuperar estas memórias constitui uma missão imperiosa na afirmação identitária de Lousada e dos lousadenses.
19h15
Participação Livre